sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A emoção do futebol

Na noite de quarta-feira o Palmeiras perdeu para o Goiás por 2 a 1, no Pacaembu, e foi eliminado da Copa Sul-Americana, podendo empatar o jogo ao lado de sua torcida. Você que acompanha futebol entende perfeitamente o que aconteceu. Você que não acompanha provavelmente tá se lixando pra isso. Mas o que eu quero falar é algo muito maior do que a vitória do Goiás ou a derrota do Palmeiras: quero falar dos sentimentos dos torcedores.


As imagens que as câmeras da Globo e do Sportv (não sei se a Band também) flagraram de um garotinho chorando após o 2º gol do Goiás foram parar na capa do jornal Lance! de quinta-feira. A emoção do garotinho lembra a da foto de Reginaldo Manente que estampou a capa do Jornal da Tarde no dia seguinte à eliminação da seleção brasileira na Copa de 1982, quando o time canarinho perdeu por 3 a 2.


O que você vê num torcedor? Alegria, exaltação, tristeza, toda espécie de sentimentos. Tudo vem à tona em 90 minutos, e nos minutos anteriores e seguintes a eles. Não é simplesmente assistir a 22 marmanjos correndo atrás de uma bola, como a galera que odeia futebol adora não mudar o discurso e dizer sempre a mesma coisa.

No momento em que eu vi aquele menino chorando pela derrota do Palmeiras, eu pensei: 'caramba, que bom que eu gosto de futebol'. Não foi uma coisa feia, não é vergonha pra ninguém chorar por causa de futebol. Eu espero sinceramente que ele se orgulhe de ser palmeirense pro resto da vida. Se os outros pensam que não vale a pena chorar por isso, o problema é deles. Se pensam que não vale a pena comemorar por uma vitória, o problema também é deles. Não condeno quem não sente prazer em apreciar o futebol. Condeno apenas quem julga aqueles que se permitem emocionar com ele.

Como contei nesse post, chorei duas vezes por causa de futebol, ambas pelo Flamengo. E, para exemplificar o que eu disse, vou contar as duas histórias.

A primeira vez foi em 2004. Final da Copa do Brasil, Flamengo embalado, pegava o Santo André, que na época estava na série B e era a mesma coisa que nada. No primeiro jogo, em São Paulo, empate em 2x2. Isso dava a chance ao Flamengo de empatar o jogo no Maracanã em 0x0 ou 1x1. Perdemos. Com 70 mil pessoas no estádio, perdemos. Fiquei bravo, chorei um pouco, e fiquei com vergonha.

O meu grande problema foi em 2008. O Flamengo estava nas oitavas-de-final da Libertadores, e o adversário era o América do México. No intervalo entre as duas partidas, foi bicampeão carioca, depois de ganhar o jogo no México por 4x2. Pra quem não sabe, num campeonato como a Libertadores, assim como na Copa do Brasil, o gol fora de casa é decisivo. Nesse caso, o Flamengo tinha dois gols de vantagem, e 4 gols fora de casa. Para um time que teria a torcida inflamada pelo título estadual no jogo de volta e poderia perder até por 2x0 ou 3x1, a classificação parecia certa. Eu mesmo fiz a cagada de dá-la como certa. Pretendia viajar pra Santos, onde o Flamengo poderia jogar nas quartas-de-final. Mas, no dia 7 de maio, tinha o jogo de volta.

Teve confusão no trânsito do Rio, o time chegou em cima da hora no estádio.  Festa para o Joel Santana, que estava se despedindo do time. Ninguém se lembrava da presença do América. Até o jogo começar. Aos 20 minutos do 1º tempo, um gordinho paraguaio chamado Cabañas chutou, a bola desviou no meio do caminho, e encobriu o goleiro Bruno. 1x0. "E daí, né?", eu pensei. Eu podia pensar assim, a torcida podia pensar assim, o Flamengo não. Mas pensou.

Naquela quarta-feira, todo mundo queria saber da prisão do casal Nardoni. Menos a torcida do Flamengo, ainda mais naquele momento. A Globo não estava nem aí, e dividiu a tela em duas partes. Enquanto qualquer repórter dava as informações que eu não queria ouvir, o Flamengo levava o segundo gol. Fiquei preocupado. O tempo passou. O segundo tempo veio. Meus pais vieram assistir o fim do jogo comigo. O Flamengo perdia gols, e não podia levar mais um. E eu comecei a ficar nervoso, porque pra mim estava muito claro que aquele time ia tomar o terceiro gol que seria o golpe faltal.


E tomou. Faltando 15 minutos para o fim da partida, aquele mesmo gordinho filho da puta cobrou uma falta de muito longe, a bola desviou na barreira e entrou. Fiquei paralisado, desesperado, mas sem sair do lugar. Faltou ar. O jogo acabou, e eu comecei a chorar compulsivamente. Meus pais ficaram preocupados, falaram que "futebol não é pra isso", e coisas do gênero. Mas, no fundo, eu sabia que era, infelizmente. Disse a eles que não iria na aula no dia seguinte, e não fui. Fui pra cama, e demorei horas pra dormir. A tristeza demorou dias pra passar. Não abandonei o Flamengo, nem pensei nessa possibilidade. E não descartaria aquele momento, porque pra mim foi uma experiência. Ruim, mas uma experiência.

Hoje eu estou contando a minha maior tristeza na minha vida como torcedor de futebol, e provavelmente é a mesma de muitos. Só pra mostrar como o futebol é capaz de provocar sensações impressionantes pra algo que é tratado muitas vezes como algo irrelevante e com uma indiferença que não merece.  Poderia ter contado a minha maior alegria. Poderia ter contado muitas outras. E não vejo como não encerrar com a frase do comentarista Mauro Cézar Pereira, da ESPN Brasil:

"O futebol é assim, ensina desde cedo o que é euforia extrema e sofrimento profundo. É aula de vida. E é por essas e outras que nós adoramos isso.

E nunca é demais lembrar: melhor do que vencer é ter um time pelo qual torcer."

Pra quem não teve a oportunidade de ver a atrocidade que foi Flamengo 0x3 América (MÉX), veja (com o famoso "A bola pune" do Muricy Ramalho no final):

1 comentário:

  1. Chorei pra cacete quando o Corinthians foi eliminado da Libertadores de 2000. Você nem era nascido ainda. RISOS. Também, a mesma situação. Minha mãe ficou preocupada, falou que não era pra tanto.

    E, detalhe, TODOS os meus amigos da escola nessa época eram palmeirenses. O único corintiano era um cara popularzinho que não gostava de mim. Hahah. Sofri.

    Tempo passou, etc, panz. Fiquei uns 10 anos sem prestar atenção em futebol, e vivi a situação parecida com a Libertadores desse ano. Fiquei tenso PRA CARALHO antes dos jogos. No jogo de volta contra o Flamengo, tava tomando cerveja com o meu pai e mal conseguia segurar o copo.

    A gente se foderem com esse jogo, mas só de ver, no final, toda a galera aplaudindo o time ao invés de vaiar, foi outra história. No final do jogo, eu fiz questão de beijar o escudo e bater no peito, e também fiz questão de sair com a camisa do Corinthians no dia seguinte. E foi incrível perceber que o dia seguinte à nossa eliminação na competição que nós mais valorizamos, no ano do nosso centenário, foi o dia em que eu mais vi camisas do Corinthians pela rua.

    Foi foda. Eu tento ao máximo tratar futebol só como diversão, mas a marca que ficou nesse dia foi foda.

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