quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Apito final

Essa história começou há mais de 6 anos, e está terminando hoje. Pode ser algo bobo pra maioria de vocês, mas representou muito pra mim. Afinal, uma coisa que durou um terço da minha vida não pode ser insignificante. Não pra mim.

Na verdade mesmo, começou há mais de 12 anos, quando meu irmão resolveu entrar numa escolinha de futebol (aliás, odeio chamar de "escolinha", parece que só aceitam crianças com até 10 anos de idade). Lembro-me muito bem dele e do meu pai sentados na mesa da sala de jantar, examinando um panfleto em que estava escrito "São Paulo Futebol Center". Eu estava do lado, nem gostava de futebol, mas entrei na onda.


- Pai, também quero.

- Mas você é muito pequeno (eu tinha cinco ou seis anos) e blablablá - foi mais ou menos o que ele deve ter me falado.

- Mas eu quero.

No fim, eu entrei, junto com o meu irmão, na escolinha de futebol do São Paulo. Não fazia nada no campo, parava na lateral, coçava a bunda, cutucava o nariz, brincava com o montinho de areia que tinha ali, e nada de jogar bola. O máximo que eu fazia era bater pênalti, porque o professor pedia, e mandava o goleiro deixar a bola entrar. Eu não gostava de ir jogar, essa é a verdade. Tanto que saí de lá pouco tempo depois.
Fomos vice-campeões. Acho que tinham dois times.

Em 2004, já começando a me apaixonar por futebol, eu voltei. E lembro exatamente o dia: quinta-feira, 28 de outubro. Não pelo dia em si, mas pelo dia anterior, em que o Serginho, zagueiro do São Caetano, sofreu uma parada cardiorrespiratória durante um jogo contra o São Paulo, e acabou morrendo. Dessa vez, tudo foi diferente. Nunca deixei de ir a um treino porque não estava com vontade, ao contrário do que eu fazia antes.

Como o São Paulo não apoiava e nem sequer listava a unidade de Taubaté em seu site oficial, a escola mudou, e virou "Meninos da Vila", do Santos, em setembro de 2005. Quando me formei na 8ª série, no fim do ano, pensei que não poderia continuar ali em 2006, por causa do ritmo do Ensino Médio. Mas continuei, e levei numa boa. Quando precisei, mudei de horário. Cheguei a jogar com meninos 5 anos mais novos do que eu. Tudo pra não sair de lá.

Quem vê pensa
No fim de 2008, passei na faculdade, em São Paulo. Então, obviamente, em 2009, eu não poderia continuar a jogar no Santos ("Santos", como sempre chamei, nunca gostei de "Meninos da Vila"). Ou poderia. Cheguei a avisar que iria sair, mas na primeira semana de faculdade, percebi que seria possível continuar a treinar uma vez por semana, no fim da tarde das sextas-feiras. Durante as férias, voltava a treinar mais vezes.

Já em 2010, em outubro ou novembro, fui avisado que o horário da minha turma de sexta-feira seria alterado para 14h30. Continuei no horário antigo até as férias começarem, e concluí que enfim, quando as férias acabassem, seria impossível continuar. Eu, com 18 anos, me senti velho, pela primeira vez. Velho mesmo, a ponto de achar que o dono, os professores e os alunos, quando me viam,  se perguntavam: "o que esse cara ainda faz aqui?" E o sentimento era ainda pior quando alguém ficava sabendo que eu estava na faculdade, e em outra cidade. Dava até pra ouvir o pensamento: "nossa, vai embora". Foi estranho ler comunicados, panfletos, e ver que as categorias mais velhas já eram de 94 (eu sou de 92). Mesmo sabendo que eu só estava ali pra jogar bola, pra me divertir, fazer o que eu gosto.

Fiz gols, perdi gols, suei, corri, andei, viajei... Hoje, ouvi o meu último apito final no Santos. Nunca gostei de apitos finais, porque é o instante em que o jogo termina. É quando eu percebo que um momento que parecia infinito uma ou duas horas antes chegou ao fim. E esse, hoje, foi o pior apito final de todos.


Agradeço a cada aluno que entrou, saiu, até aos que me xingaram... e aos poucos amigos que fiz, ainda que o contato não seja frequente ou a amizade não seja tão forte assim. Agradeço a cada professor: Piorra e Amauri (da época que eu treinava com o meu irmão); Rafael, Marcelo, Wagner, Osvaldo, Lucas, Pablo, Guilherme, Leandro, Michel e Rodrigo (e eu devo ter esquecido de algum). Agradeço aos funcionários, e até ao Vicente, dono da escola, que passou a me importunar pra escrever algumas linhas desde que soube que eu comecei a fazer Jornalismo.

Por fim, um recado pra quem fez gracinha, pra quem acha engraçado eu ter feito "escolinha", por jogar bola e não trabalhar, ou sei lá: eu aproveitei ao máximo essa chance de poder fazer o que eu gosto com frequência. Não iria ficar em casa ou trabalhar, numa tarde de sol ou de chuva, se eu ainda tinha a oportunidade de estar fora dali fazendo uma coisa que eu gosto dez vezes mais. A vida passa rápido demais, e eu estou sentindo isso na pele nesse momento. E agora não posso fazer nada quanto a isso, mas estou satisfeito por ter feito tudo o que pude para aproveitar.

Eu sei o que vão pensar desse texto... que é ridículo lamentar por essas coisas, e tudo mais. Mas, repito, eu estou praticamente me despedindo de um lugar onde passei um terço da minha vida, até agora. O mínimo que eu poderia fazer era escrever sobre ele, e unir, mesmo que por algumas linhas, a minha paixão pelas palavras a um lugar onde eu fui muito feliz.

3 comentários:

  1. Vc pediu um comentario e aqui está. Acho que ter vergonha de fazer algo que gosta é ridículo. Não te compreendo porque nao me lembro de ter passado por algo semelhante, mas entendo o lado da tristeza por saber que nao mais irá fazer algo que vc gosta tanto.
    Fique sabendo que qualquer sexta a noite que estiver triste por nao estar jogando bola pode ir assistir uma aula de direito empresarial comigo ahhahahahha
    Brincadeira...mas levanta a cabeça e BOLA PRA FRENTE!!!

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  2. No começo, eu confesso que não entendia a sua paixão. Eu era, sem dúvida, um dos que pensava que era perda de tempo. No entanto, depois fui vendo que aquilo era super importante pra você. E, de quebra, te fazia feliz. E não é isso que importa afinal?

    Sua história me lembrou da irmã de um amigo meu. Ela recusou um estágio formidável porque, no horário oferecido, ela não poderia fazer balé. E ela me explicou assim: "Eu trabalho para pagar o balé. Porque eu aceitaria um emprego que me impediria de fazer o que eu mais gosto?"

    Acho que é a mesma linha de raciocínio contigo. O importante é conciliar as coisas que você mais se importa na vida.

    E, bem, não pense que acabou. Há algumas academias que tem campeonatos internos e aulas de futebol :) Alguns tios e primos meus fazem. Nunca é tarde pra fazer o que se gosta.

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  3. P/variar, lindo seu texto!!
    Emocionei-me lembrando desde o seu começo na "escolinha de futebol". Quando vc foi p/faculdade eu até pensei que vc não fosse mais querer frequentar a tal "escolinha", mas vc conseguiu convecer todo mundo e continuar...esse foi o apito final de uma etapa, agora com certeza vai ter uma apito indicando o início de uma nova fase.
    bjs

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